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Advogado, pós-graduando em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera-Uniderp e empresário em Comércio Exterior.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Sob a Proteção Divina e da Constituição da República Federativa do Brasil.


Sob a proteção de Deus tornamos pública nossa Constituição Federal. Ao menos essa é a afirmativa que nós, brasileiros, bradamos no preâmbulo da Carta Magna de 1988.

Asseveramos no artigo 5º, caput, com a veemência inerente de cláusula pétrea, que todos são iguais perante a lei e que nenhuma distinção, seja ela qual for, será interposta entre seus destinatários e aquela igualdade, com o fito de solapá-la.

Alí, em nosso documento maior, ainda em seu artigo 5º, enaltecemos a liberdade de consciência e de crença, dizendo sê-las invioláveis. Asseguramos o exercício, livre de interferências, dos cultos religiosos e garantimos, até mesmo, proteção aos locais onde se realizam seus ritos. Garantimos, também, a prestação de assistência religiosa em entidades civis e militares de internação coletiva, como são exemplos hospitais, forças armadas e estabelecimentos prisionais. E ninguém será destituído de direitos por motivo de crença religiosa – ou de convicção filosófica ou política –, a não ser que a invoque para escusar-se de obrigação por lei a todos indistintamente imposta e recusar-se a cumprir, sem justificativa ou motivo bastante, prestação alternativa que venha a ser fixada em lei.

No capítulo destinado à educação, dispomos no artigo 210 de nossa Lei Maior que, no ensino fundamental, uma formação básica dos valores religiosos será assegurada através da fixação de conteúdos mínimos, de cunho não obrigátorio.

E, no artigo 19, com o intuito de mantermos uma neutralidade nas manifestações Estatais quanto a assuntos religiosos, achamos por bem proibir todas as pessoas jurídicas de direito público interno – e, com isso, seus órgãos, fundações e autarquias – de qualquer ato cuja intenção seja a de instituir ou subsidiar determinados cultos religiosos ou igrejas, assim como vedamos, com a mesma exaltação, qualquer imposição que venha dificultar o regular funcionamento deste ou daquele culto religioso ou desta ou daquela igreja, sem que haja relevante justificativa legal. Estabelecemos ali, ainda, que tal vedação deve estender-se, inclusive, quanto a ato que represente uma dependência ou aliança entre a pessoa jurídica de direito público interno – ou órgão, fundação ou autarquia a ela vinculados – e qualquer entidade religiosa ou seus representantes.

O que queremos dizer é que somos uma pluralidade de conceitos e manifestações religiosas e metafísicas. Erigimos a tolerência multi-existencial de crenças no Texto Constitucional não como um ideal a se seguir em detrimento de um favoritismo mesquinho e particularizado a uma determinada forma de pensar ou crer, mas sim como um mandamento legal, uma imposição de agir sem preconceitos ou discriminações.

Todos são livres para eleger a compreensão suprassensível da realidade de maneira que achar mais conveniente às suas convicções. Todos são livres, ainda que para optar pela absência de crença ou credo. E para enaltecer essa liberdade, assegurá-la, nutri-la, honrá-la, fizemos por bem manter uma neutralidade inequívoca em toda a extenção do texto de nossa lei maior. Ao afirmarmos, sob o manto da imparcialidade, uma proteção divina, fizemos a escolha por um Estado Laico em oposição à constituição de um Estado Teocrático, como é o caso, por exemplo, do Irã, que prega vínculo ao islamismo, e do Vaticano, que mantém aliança com o catolicismo, todos com a característica de forte influência religiosa nos atos políticos de seus representantes.

O laicismo manifesta-se justamente pela separação do que é do Estado e do que é da igreja – ou comunidade religiosa. Dizer-se laico – um Estado – é afirmar que suas decisões não são guiadas pela influência de uma ou outra religião, credo ou culto. Dizer-se laico é exaltar a liberdade de consciência, a igualdade entre cidadãos em matéria religiosa, e a procedência, humana – em oposição a uma origem divina – e democraticamente estabelecida, das leis do Estado.

Desta maneira, atos como a ostentação de crucifixos em salas de aula de escolas públicas, livros sagrados em fóruns e cortes de julgamento, símbolos que determinam a adesão a uma determinada religião em repartições e setores públicos, por mais natural e bem intencionado que se possa parecer, traz uma tendenciosa mensagem que não coaduna com a neutralidade que se impõe pelo texto constitucional.

Aqui não se prega a abstenção de religiosidade àqueles que ocupam cargos ou funções públicas, mas o comprometimento a uma atuação comedida e nos termos exarados no ideal constitucional de neutralidade e imparcialidade e em seus mandamentos, como vistos anteriormente.

Numa democracia, as pessoas são livres para exprimir qualquer opinião. Entretanto, o mesmo não se pode dizer dos prédios, setores e repartições públicas.

Bibliografia:
Conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), o texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:
GREGÓRIO, Adriano Beluci Corrêa Santos. Sob a Proteção Divina e da Constituição da República Federativa do Brasil.

terça-feira, 11 de maio de 2010

A alteração da data de pagamento do tributo deve respeitar o princípio da estrita legalidade tributária?



Por Adriano Beluci Correa Santos Gregorio


Antes de firmarmos uma ou outra resposta, mister se faz erigir certos conceitos legais e doutrinários para que, através de um caminho de conhecimento, sejamos imbuídos de elementos bastantes ao esclarecimento da possibilidade teórica a que ora nos debruçamos.

“Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”, assim nossa Constituição Federal, em seu artigo 5º, inc. II, estabelece um dos mais importantes princípios do Direito – a legalidade. Sua importância decorre do fato de que encontra-se atado ao próprio Estado Democrático de Direito, sendo dele elemento indissociável ou, ainda, como nos ensina Celso Ribeiro Bastos[1], “não há Estado de Direito sem o princípio da legalidade.”

Assim, como elemento balizador do poder, vem o princípio da legalidade inscrito no texto Constitucional garantir segurança jurídica e patrocinar equilíbrio social, principalmente quanto àqueles atos administrativos cuja discricionariedade de atuação é regra, pois até mesmo o espaço reservado à liberdade de atuação discricionária deve encontrar fronteiras na previsão legal, sob pena de não estar revestido de validade jurídica.

No campo específico do Direito Tributário, exsurge o art. 150, inc. I, da CF/88, asseverando que, “sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, aos Municípios e ao Distrito Federal exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça”.

Pontes de Miranda nos ilumina a compreensão dizendo que a manifestação mais legítima do princípio da legalidade no campo tributário reflete-se na constatação de o povo tributar-se a si mesmo. É corolário do Estado de Direito exigir-se daqueles que detêm o poder o comprometimento às regras estabelecidas em parlamento – enquanto centro legítimo de emanação da vontade popular –, principalmente naquilo que concerne a uma obtenção forçada de bens, refletindo-se na compulsoriedade de abastecer os cofres públicos com as economias particulares dos indivíduos que compõem dada sociedade.

É o poder de soberania do estado que dá fundamento ao exercício de cobrança compulsória e inescusável de prestações em dinheiro, ou em valor que nele possa exprimir-se, ao qual o contribuinte está obrigado devido a uma manifestação de capacidade econômica.

O princípio da legalidade encontrado no artigo 5º, inc. II, da CF/88, por ser genérico e abstrato, não deve se confundir com a reserva legal ou estrita legalidade estabelecida, em matéria tributária, no artigo 150, inc. I, da CF e no artigo 97 do CTN. Aqui o legislador especifica a matéria a ser objeto de lei e determina a via normativa que deverá veicular determinados assuntos, implicando a reserva absoluta de lei, de modo que devem os elementos que constituem a regra matriz de incidência tributária derivarem, não apenas de base legal, mas diretamente através de lei.

Nosso CTN, especificamente sobre o vencimento da obrigação tributária, preceitua que “quando a legislação tributária não fixar o tempo do pagamento, o vencimento do crédito ocorre trinta dias depois da data em que se considera o sujeito passivo notificado do lançamento.”[2] Como se sabe, o CTN expressamente conceituou legislação tributária no art. 96, incluindo-se na expressão os decretos do executivo e as normas complementares às leis, aos tratados, às convenções internacionais e aos próprios decretos. Deste modo, vem o Poder Executivo, através de atos infralegais, firmando, ou mesmo, alterando, a sua discrição, a data que o tributo deverá ser recolhido aos cofres públicos.

A possibilidade de alteração de data de pagamento de tributo por instrumento infralegal tem tido respaldo jurisprudencial do STJ e do STF.[3] Chegando o STF a expedir súmula posicionando-se, até mesmo, pela não sujeição do prazo de pagamento ao princípio da anterioridade.[4]

Tal direcionamento da jurisprudência de nossos tribunais baseia-se no entendimento de que o prazo de vencimento do tributo não é elemento da norma que institui o tributo, ou seja, não constitui elemento da hipótese de incidência, de maneira que sua fixação independeria de lei em sentido estrito. Assim, apontam que a alteração do prazo de recolhimento do tributo não afeta, por exemplo, o seu fato gerador, a sua base de cálculo ou a alíquota aplicável, de modo que não haveria, então, necessidade de manifestação legislativa disciplinando a situação.

Os defensores desse posicionamento prelecionam, ainda, que o artigo 97 do CTN seria abrigador de numerus clausus[5], relacionando taxativamente, ou seja, de modo exaustivo, as matérias que devem obediência à reserva legal, não fazendo menção alguma à data de vencimento.

Em brilhante oposição a esse entendimento, o professor Hugo de Brito Machado[6] nos esclarece que o prazo de pagamento deve, sim, ser objeto de lei em sentido estrito, pois esta “deve estabelecer tudo quanto seja necessário à existência da relação obrigacional tributária”. “Especialmente quando se trata de tributo sujeito a lançamento por homologação, em que o pagamento é antecipado pelo contribuinte”, diz o renomado mestre. Essa também é a intelecção do ilustre Sacha Calmon Navarro Coêlho que afirma sempre ter estado em desacordo com os dizeres do art. 97 do CTN, por este não incluir nas matérias reservadas à lei o prazo para pagar.[7]

Tendo em mente que nem tudo acha-se minuciosamente descrito em nosso CTN a fim de coibir a apetite arrecadadora do estado ou impedir certas determinações que, modificando de súbito o universo jurídico que orbita a regra matriz de incidência tributária, venham causar prejuízos ao contribuinte, certas considerações devem ser levantadas.

Como não considerar a data de pagamento do tributo um elemento da relação jurídico-obrigacional tributária se é exatamente com sua fixação – e consequente adimplemento – que a relação obrigacional dá-se por finalizada? Na sua ausência, fato gerador, base de cálculo, alíquota, entes tributante e tributado, todos arrastariam sua existência indefinidamente no tempo, mesmo que sua forma, ou modo de extinção – seja pelo pagamento, compensação, transação, remissão ou qualquer outro meio disposto ao longo do artigo 156 do CTN – também tenha sido previamente estabelecido. Tão importante quanto precisar o nascedouro da obrigação tributária, através de lei, é definir por completo sua extinção. Tanto é assim que o próprio CTN, em seu artigo 97, diz, claramente, que “somente a lei pode estabelecer a instituição de tributos, ou a sua extinção”.

De todo o exposto, em que pesem as bem intencionadas teorias em contrário, somos levados a concluir que as alterações de data de pagamento não podem ocorrer através de ato infralegal devido ao fato do tempo de cumprimento da obrigação tributária caracterizar-se como elemento essencial da regra matriz de incidência, devendo, desta forma, sua existência estar indiscutivelmente sob o manto da estrita legalidade, sob pena de se ter por aviltado a segurança jurídica das relações em sociedade e o próprio cerne do Estado Democrático de Direito.


Bibliografia:

Bastos, Celso Ribeiro. Comentários à Constituição do Brasil. 2º Volume, Ed. Saraiva, 1988-1989

Carrazza, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. Ed. 21ª. Malheiros Editores, 2006.

Carvalho, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. Ed. 17ª. Ed. Saraiva, 2005.

Coêlho, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. Ed. 9ª. Ed. Forense, 2007.

Costa, Alcides Jorge. Da Extinção das Obrigações Tributárias. São Paulo. Limitada. USP, 1981.

Machado, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. Ed. 27ª. Malheiros editores, 10.2006.

Paulsen, Leandro. Direito Tributário: Constituição à Luz da doutrina e da jurisprudência. Ed. 11ª. Livraria do Advogado Editora. ESMAFE, 2009.




[1] Bastos, Celso Ribeiro. Comentários à Constituição do Brasil. 2º Volume, Ed. Saraiva, 1988-1989. Pg. 24.
[2] Artigo 160 do Código Tributário Nacional. Lei 5.172/66.
[3] REsp 55.207 e 55.537; RE 203.684, 173.294, 140.669 e 195.218.
[4] Súmula 669 do STF: “Norma legal que altera o prazo de recolhimento da obrigação tributária não se sujeita ao princípio da anterioridade”.
[5] Entre aqueles que defendem que o rol do artigo 97 do CTN é numerus clausus, temos o célebre Alcides Jorge Costa. Da Extinção das Obrigações Tributárias. São Paulo. Limitada. USP, 1981.
[6] Machado, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. Ed. 27ª. Malheiros editores, 10.2006. Pg. 58.
[7] Coêlho, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. Ed. 9ª. Ed. Forense, 2007. Pg. 798.


Conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), o texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:
GREGÓRIO, Adriano Beluci Corrêa Santos. A alteração da data de pagamento do tributo deve respeitar o princípio da estrita legalidade tributária?